Livro "A FARSA - a passagem de Mengele na Amazônia - CAPITULO X -Religião, pesquisa e os Indios Paumaris

07/03/2013 16:36

CAPITULO X

A RELIGIÃO COMO ESCUDO

PASTOR GLADSTONE

Americano característico, faces duras e retilíneas, cabelo curto, corpo atlético com mais de 1:90m de altura, tinha sido cadete em West Point, quando foi recrutado pela CIA – Central Americana de Inteligência, para desenvolver um trabalho diferente no pós guerra.

Sua missão até agora tinha sido muito simples, sempre acompanhado do Pastor John Smith, este sim um religioso ambicioso, mas com extremo domínio da palavra e das escrituras, com grande poder de convencimento.

Juntos tinham tarefas conjuntas, porém distintas. Enquanto um procurava levar o evangelho para os índios, o outro estava mapeando toda a região amazônica com seus mistérios e minérios.

Completavam-se, por que ao conseguirem a amizade dos silvícolas, tomavam conhecimentos das riquezas existentes na floresta. Muito Ouro, Diamante e outras pedras preciosas já tinham sido levados para á América. Bem como cascas, folhas e sementes de árvores, além de uma infinidade de insetos e outros bichos.

A situação era tão tranqüila que pode trazer sua família, mulher e dois filhos além dos dois agentes com família que o acompanhavam, mais um ajudante do Pastor John, também com sua família.

Em Manaus a propriedade era isolada, com cerca e de difícil acesso. O Avião era seu meio de transporte, só não gostava dos longos e demorados trechos quando voava para os Estados Unidos. A primeira parada era no Caribe, depois Costa Rica até chegar a Miami. Delá em diante, não eram mais os pequenos, mas sim jatos que os levavam a Langley, onde funcionava o escritório central da CIA.

Agora, este alemão chegava e ordens novas e surpreendentes tinham sido dadas. Isto poderia mudar seu cotidiano tranqüilo. Mas como bom militar iria cumpri-las.

Recebera a incumbência através de Mr.Cook que representava a indústria farmacêutica americana, que avançava célere nos cientistas alemães e seus laboratórios sofisticados. Albert Sabin tinha sido o primeiro por sua condição de judeu.

Na Amazônia já tinham rodado com o pequeno hidroavião quase toda a região. Sua nova incursão seria por terra nas planícies e campos naturais de Roraima, onde os Índios Yanomami, apesar de isolados, tinham sido avistados com muitos adereços de ouro. Eram os próximos a serem evangelizados. Primeiro, porém precisavam acompanhar ao médico alemão, que ninguém poderia saber de sua existência e que todos sabiam.

 

A SELVA AMAZÔNICA

O barco “Lírio do Mar” estava ancorado na Baixa da égua no bairro de Educandos. Mr. Cook se despediu de Mengele no cais do porto, este entrou numa pequena embarcação de remo, chamada de catraia pelos nativos e foi até onde estava o barco. Ninguém soube, nem ele despertou atenção. Ao contrário de sua anunciada chegada, agora ninguém sabia de sua partida, tampouco de seu destino.

No barco Severino o esperava com sua tripulação. Abraçaram-se e Severino foi logo falando:

- Doutor é o seguinte. Colocaram um monte de tralhes, vidros, fogareiros, seringas, pequenos vidrinhos e uns tubos que disseram ser de gás, que fiquei preocupado. Comprei uns paneiros, forrei com folhas de embaúba, bananeira e coloquei com muito jeito. Fiz certo?

Mengele sorrindo responde:

- Claro. Você sempre nos surpreende. Fizeste melhor do que a encomenda. Vou precisar disto tudo lá para onde vamos. Você conhece a região do Purus?

- Mas claro. Este mundo de água tem sido minha vida. Já fui várias vezes até o Acre pelo rio Purus. Responde Severino.

- Acre, o que é acre? Logo pergunta o alemão.

- É um estado como o amazonas. A mata é semelhante, só lá a terra é melhor para a agricultura. Diz Severino.

- Vocês brasileiros são fogo. A gente pergunta uma coisa, vocês respondem sempre com novas coisas que não conhecemos. Aí complica tudo. Vamos logo viajar. Não agüento mais ficar parado. Completa Mengele.

- Vamo que vamos. Fala Severino rindo e tomando com as mãos o timão do barco.

Os dias se arrastam na imensidão do rio. Passaram por uma vila, depois pequenos povoados. De ambos os lados do rio uma floresta que parece ser impenetrável. A cada curva um formato diferente, e quantas curvas têm este rio, pensa Mengele.

De um lado praias e terra firme. De outro chavascal e várzeas onde a água na cheia entra por kilômetros. Árvores imensas nos dois.

Em duas ocasiões distintas chegou a avistar índios na beirada, mas estes logo sumiram de sua visão.

Diferente da vinda de Belém para Manaus quando tudo era novidade e prendia atenção. Agora a repetição da mesmice o deixava impaciente.

Ao terminar uma semana de viagem, Severino subiu até o segundo passadiço, Mengele havia subido ao toldo e lá sentado com seu livro de anotações descrevia o que estava vendo. Absorto em seus escritos não percebe a chegada dele. Quando este fala:

- E aí Doutor, escrevendo para a zinha de Parintins?

Surpreendido, Mengele quase deixar cair seu livreto, se volta e diz:

- Lá tenho eu tempo para isso. Estou escrevendo o que vejo desta floresta estúpida e deste rio desgraçado.

- Calma meu caro. Vim até aqui para dizer, que amanhã de manhã estaremos entrando na Boca do Rio Tapauá a caminho da casa dos Paumari. Completa Severino.

Ao olhar para a margem, Mengele observa um longo trecho de barranco caído, com desnível em alguns locais de mais de dois metros de altura. Intrigado pergunta:

- Aqui tem terremoto.

- Terremoto. O que é isso. Responde, perguntado Severino.

- É um forte tremor de terras. Olhe ali, parecem às marcas de um. Aponta ao barranco e na linha desnivelada com aparência de um acontecimento recente.

- Ah. Isso aí. Não! Não é terremoto, isto é terra caída.

- Como assim terra caída. Pergunta o alemão.

- É o seguinte, de um ano para outro o rio fica cavoucando o barranco por baixo, peixes tipo o Acari Bodó, Tamuatá e outros bagres se escondem no buraco e também cavam. Depois o rio seca, fica tipo uma gruta, mas de terra preta, quando a água enche de novo, muitos destes lugares cavoucados, simplesmente deslizam para o leito do rio. A maioria em toda a extensão  e quase sempre na curvas, em margens alagadiças. Explica Severino, completando:

- Tem das vezes que leva toda a frente de uma vila, casas, barracos, gentes e animais para dentro do abismo das águas. Só fica o babujo e os redemoinhos. Tudo some...

- Puta que pariu. E como se sabe onde vai acontecer este fenômeno. Pergunta o alemão.

- O que é fenômeno. Pergunta Severino.

- Porra. Isto que você explicou, este tal de  “Terra caída”...

- Ah. Isto só acontece em terra fraca. Aterro, ou onde era várzea, entrada de lago, ou área de desmatamento. Não tem vida, não tem árvores, arbustos, aí tudo cai, não tem onde se segurar. Complementa Severino

- É, mas ali, tem uma árvore grande caída. Como se explica. Ironiza o alemão.

- É, só tem uma. Estava desguarnecida, as outras cortaram ou caíram. Esta não agüentou. Diz Severino.

- Quer dizer que se manter a mata, a destruição é menor. Acrescenta o alemão.

- É por aí. Encerra Severino.

 

A FOZ DO RIO TAPAUÁ

Uma neblina esparsa se estendia por sobre o rio. Na margem avistaram algumas casas flutuantes, Severino conduz o barco até a maior delas e atraca a embarcação.

Logo a porta principal de flutuante se abre e aparece um homem branco, magro e alto. È Pedro Guedes o dono do comercio flutuante. Reconhece Severino, o saúda. Com desconfiança olha para o homem alto e sério que surge por detrás deste. Com um leve movimento do queixo, um olhar inquisitivo, aguarda silenciosamente;

Severino entende e logo vai explicando:

- Meu amigo Pedro Guedes! Este gringo tem interesse em folhas, insetos, borboletas e utensílios fabricados pelos índios. Está vindo para esta região atrás destes produtos. Estou te indicando como contato para estas compras quando tiver viajando. Posso contar contigo?

- Se der para eu ganhar uns trocados, pode não só contar como também irei atrás. As coisas não estão muito bem por aqui. Responde o caboclo.

- Mas vamos chegando. Minha “véia” acabou de passar um café e está aprontando uma tapioca. Podem entrar que a casa é simples, mas recebe todos. Completou ele.

Severino e Mengele entram no recinto. Na frente um pequeno salão. Cordas, panelas, utensílios de plástico dependurados, tambores de combustíveis, sorva, bolas de látex, sementes de castanha, cascas diversas e peixe seco enchiam o local. Dividindo um balcão rústico. Atrás deste uma prateleira com algumas mercadorias, enlatados e garrafas de cachaça. Uma porta servia de comunicação com os fundos de onde vinha um cheiro delicioso de café e o resto da casa.

Encostaram-se no balcão. Uma jovem de não mais de 15 anos entra trazendo uma garrafa térmica e copos de plástico e coloca sobre o mesmo. Os dois visitantes seguem a moça com o olhar. Pedro Guedes vai logo dizendo:

- Esta é Maria Raimunda, minha filha mais velha. Mas, todos a chamamos de “Mundica”. Ela é o braço direito da casa.

Os dois se entreolham e nada dizem.

Passando pela cortina de chita que separa os dois ambientes, Mundica sente o olhar dos dois homens á suas costas. Depois de alguns minutos, volta para a porta e pela lateral espia-os. Aguarda alguns instantes, improvisa uma tosca bandeja e retorna ao lado comercial.

Os dois homens a olham, ela baixa os olhos e pelo canto observa o grande alemão. Seus olhos se cruzam, Mundica estremece e enrubesce, Mengele sorri convencido. O contato foi feito. Caça e caçador estão á espreita.

Depois de mais alguns acertos e compras de provisões (Peixe e carne de caça salgados) de utensílios de pesca, Severino diz para Pedro Guedes;

- Bom meu amigo, vamos seguir viagem. Depois de instalar o nosso amigo vou retornar e passo por aqui. Quando eu descer para Manaus e ele precisar de alguma coisa pode atender, eu me responsabilizo.

- Tudo bem. Pode viajar tranqüilo. Responde ele.

Após um cumprimento de mão no dono da casa, Mengele por sobre o ombro do homem, pisca para Mundica, que sorri atrevida, mas arrisca sai do campo de visão. Pedro percebe alguma coisa e se volta para a porta, nada vê. Com um aceno do barco todos se despedem. A menina-moça, da varanda da cozinha do flutuante também acena.

Severino logo brinca com o alemão:

- Mais uma para fazer experiências ou para traçar?

- Nada disso. Responde o Alemão. – Apenas política de boa vizinhança.

Os dois caem na risada.

O grande barco para a região vai cortando as águas mansas e lisas do Rio Tapauá, na margem direita do Rio Purus. Um coral de espuma fica pra trás da embarcação. O barulho do corte da água pela proa do barco parece com o som do gás sendo despejado por cima dos judeus, pensa Mengele. Lembranças tristes e frustradores vêm a sua mente. Chacoalhando a cabeça e se levantando para espantar os fantasmas do passado. Vai até a cozinha do barco e se serve dum generoso gole de café. Aos poucos se acostuma com o café muito adoçado que servem na embarcação e em todos os lugares desta vasta Amazônia.

O Rio Tapauá, é formado pelos Rios Minauã, Branco e outros menores. Sua foz tem a extensão de vários kilômetros. Suas matas são densas, com árvores altas e bosquejadas. De um lado, do outro uma várzea rica e farta. Vários lagos piscosos completam esta área.

Desde a entrada neste caudaloso rio, nenhuma habitação e nenhuma viva alma havia sido avistada. Mengele vai até o comando e pergunta a Severino:

- E aí. Quando vamos chegar aos selvagens?

Severino responde:

- Agüenta um pouco. Vamos viajar o dia inteiro, mais a noite e então vamos entrar no rio Minauã. De lá vamos entrar no Igarapé Açu até a boca do lago Marahã. Nesta época eles devem estar por lá.

Os dois estavam falando dos índios Paumari.